transumância
escrevemos, dizemos, falamos. ouvimos dizer, falar, lemos. um cubo mágico de palavras onde a policromia é escassa apesar de se falar sobre tudo, nada há que escape ao discurso, não há zonas de sombra, tudo se diz. cada um pensa na autenticidade mas repete numa mimética exacerbada e entusiasta o que de mil modos já foi dito, falamos do mesmo sem saída. modernos os que assim rodam o cubo mágico à procura de uma verdade, uma essência ou sentido que se esboroa contínua. este que aqui vos trago é mais um simulacro que visa perpetuar o jogo. a essência não se encontra à flor da pele, tão pouco é possível escavar muito, escavemos e na cratera encontramos bracitos de bonecos, cabecitas que perderam os parceiros para a sua roda, perdidos debaixo de camadas de palavras apetecíveis e banais. como ondas de setembro o que tanto discurso deita é lixo, os fragmentos não chegam para o sentido e, pelo contrário na sua despudorada produção apagam-lhe o rasto. dois exemplos nos antípodas da sua natureza mas sempre convocados na sua necessidade de ser ditos: o caso maddie e o amor. somos todos autoridade para emitir opinião e atente-se quão pouco esclarecidos estamos, como se quanto mais opiniões mais dificuldade em ver.
este amontoado de palavras rosna mas também não morde, nem uma beliscadura na superfície reflectora do mundo e, no entanto, as palavras já foram setas e matracas, por elas e com elas já se subiu ao céu e desceu ao inferno. faço de conta que nada disse e continuo a sentir que sim, abafo a racionalidade naquilo que é, uma forma de produção de discurso e retenho um fragmento: transumância, transumância.
3 Comments:
gosto muito aqui de duas coisas
muito
:do vómito de palavras
da palavra em si mesma
polissémica e polimórfica
e pra mim uma palavra
de amor uma palavra
eCoante:
:transumância :)
~
Faz tempo já que as palavras eram bem mais que grãos de areia no vento...
É o progresso, dizem.
Progresso estranho, digo.
As palavras perderam-se de nós e nós delas. Creio.
Tenho saudades.
~pi: é fantástica, quem a usa muito é o Al Berto.
anonyma: também creio isso, que nos afastámos das palavras, apesar de aparentemente estarmos sempre com elas.
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