domingo, outubro 21, 2007

Pós qualquer coisa

Sou de uma geração híbrida,vivi a pós-revolução, a geração anterior chamou-lhe revolução e nós repetimos Revolução,por respeito e enlevo para com estas ideias mais sedutoras que ideológicas. Curtimos até ao tutano a liberdade como uma evidência e não como uma conquista. Não me atormenta a má consciência de ter usufruído da revolução que outros fizeram porque de algum modo peguei nas suas palavras e ao repeti-las as esconjurei, nesse gesto estava certa de haver sanado o tributo que lhes devia, mas no fundo, essencialmente falando, prefiro o capitalismo ao comunismo e aplaudo de longe, no conforto do meu sofá os movimentos pela liberdade. Não pertenço a qualquer organização comunitária ou ideológica e vacilo no meio termo entre a admiração pela força religiosa e a lucidez para ter de admitir a farsa que tudo isso ainda representa. Não me movem ideais sociais ou políticos, movem-me afectos, laços, o gosto intranquilo pela dignidade de qualquer pessoa, caso, a caso.Na homenagem ao Adriano Correia de Oliveira e ao Che observo-me a considerá-los ícones vazios que servem para ser vestidos de roupagens românticas mas que, em boa verdade já não comunicam nada, nem um estremecimento. Talvez seja esta a prova que envelheceram estes ideais, ou talvez que nunca amadureceram verdadeiramente dentro de nós.

16 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Há aqueles que lutam um dia, e por isso são muito bons.
Há aqueles que lutam muitos dias, e por isso são muito bons.
Há aqueles que lutam anos, e são melhores ainda.
Porém, há aqueles que lutam toda a vida, esses são os imprescindíveis.

É isto que eles me "comunicam". E lutaram ainda pelos outros, como Cristo, por exemplo. "Roupagens" são outra coisa.
Bj SK

10:18 da tarde <$BlogCommentDelete>
Anonymous Anónimo said...

ah... e o poema é do Bertolt Brecht, mas isso aposto que sabes.

10:18 da tarde <$BlogCommentDelete>
Blogger manhã said...

conheço o poema dito em espanhol num disco do homem de minas gerais chamado Milton Nascimento, olha lembrei-me! Reconheço que não vou ser imprescindível!Mas não o reconheço agora, já é vem de longe esse reconhecimento, reconheço também que os pés de barro desses ícones sobressaem, não,ainda não me convenceste!

10:26 da tarde <$BlogCommentDelete>
Anonymous Anónimo said...

pois eu tb não sou imprescindível, ou não fosse eu uma pequena pseudo-burguesa... mas vou lutando por um punhado de almas

10:33 da tarde <$BlogCommentDelete>
Blogger Ana Paula Sena said...

É sempre complicado sobreviver na memória enquanto emblema. Do esvaziamento simbólico ao fanatismo, tudo é possível.
Sou solidária com a tua reflexão.
Beijinhos! :)

9:46 da manhã <$BlogCommentDelete>
Blogger Mónica said...

não partilho da tua vivência, mas, apesar disso, estou de acordo qto ao facto desproporcionado de se enaltecer "ícones de palha" sobretudo através de pessoas que não viveram coisa nenhuma

basta dar uma vista de olhos por blogs absolutamente fascistas de linguagem passadista obsuleta e verificar a admiração espantosa pelo che e/ou adriano correia de oliveira

há tempos, num blog q já deitei fora, fiz um post identico ao teu sobre os elogios postumos ao alvaro cunhal, vindo de todos os quadrantes politicos, coisa mais hipocrita. talvez haja este sentimento de "tá morto fica bem dizer bem recomenda-se a s.pedro", ainda haverá quem se lembre de falar bem do pinochet???

12:18 da tarde <$BlogCommentDelete>
Blogger Martini said...

Tal como dizia o Zé Pedro dos Xutos ontem na Câmara Clara, ainda que sobre um assunto diferente, a música, como em tudo na vida evoluí-se.
E mais não digo!:)

5:21 da tarde <$BlogCommentDelete>
Blogger Manuel Veiga said...

pois é: o conforto do sofá...

como é "confortável" aplaudir de longe e não "sujar as mãos"!...

no entanto, a política (e os ícones que a personificam)são perenes. malgrée toi...

ser "apolítico" é ter ainda uma posição política! não surpreende assim que a tua opção (política) seja pelo capitalismo...

cordialmente

Herético

7:58 da tarde <$BlogCommentDelete>
Blogger Alberto Oliveira said...

... ai Manhã, Manhã, sobre o que tu foste dissertar agora nesta janela virada para o Portugalzinho virtual que é o espelho do real. É que isto de ter opinião, sentada no sofá ou em pé, na rua, ainda é coisa que bule (sem chá, naturalmente... )com o pensamento luso. Coisa difícil de passar, que a democracia inda agora é uma criança (risos irónicos).
Não confundo o pensamento (e a acção) políticas de uns quantos ( a quem tiraria o chapéu se o usasse) com o viver dignamente de imensos. E essa, é para mim a grande questão. O que fizeram os agentes políticos -de todos os quadrantes, sem excepção (pois que já todos mostraram as suas habilidades), nestes trinta e três anos após o 25 de Abril de 74? Não quero respostas idealistas; exigo actos bem concretos.

9:37 da manhã <$BlogCommentDelete>
Blogger manhã said...

salso:lutar por um punhado de almas parece-me o melhor que se pode fazer. Não é pouco.

ana paula: muitos ícones embora vazios de significado(se os analisarmos racionalmente) alimentam fanatismos vários.Bjo

mo: todos precisamos de símbolos mas eles são o que são,homens que por variadas razões se destacaram,mas não são bonecos, são homens, não podemos enche-los das nossas fantasias, medos etc.Podemos admirá-los como homens com fraquezas e forças mas a veneração esvazia-os, só mostra a nossa fraqueza, a mais dúbia, a que não se sabe ver.

martini: evolui-se, muda-se, exige-se outras leituras, para as mesmas, as de cartilha, não há paciência!Tinhas mais o quê para dizer?

herético: vou justificar o meu post já que pressinto na tua apreciação uma nota de desprezo:
1. Os ícones são perenes, malgré moi,mas não malgré todos, há ícones que já não o são, se por exemplo Che para mim já não é um ícone, para ti, aposto, que a Nossa Senhora de Fátima também não é, apesar de o ser para alguns. Daqui se pode inferir que os ícones são perenes enquanto houver alguém que os endeuse.Portanto esse argumento não me parece que sirva para desconstruir o meu.
2.Ser apolítico é ainda uma posição política, é dizer o mesmo que ser céptico é ainda uma posição dogmática,toda a gente diz isso, é um lugar comum, todavia não me parece a mesma coisa,porque se o cepticismo é uma posição de crítica o dogmatismo não é, assim como se ser político é "fazer" política, do ponto de vista de encontrar uma ideologia coerente e já previamente catalogada como direita/esquerda, ser apolítico é de alguma maneira criticar o catálogo, não se enquadrar nesta dicotomia.
Colocado o esclarecimento.
Cordialmente.
Manhã

legível: Continuo a achar que depois do 25 de Abril se fez muito,Portugal era um atraso de vida e hoje é mais dinâmico, as pessoas vivem melhor etc. Não continuo a pactuar com uma certa forma de discurso, uma emblemática e um saudosismo que são maus, não dignificam porque não nos dão novas perspectivas e é disso que precisamos, novos conceitos para compreender e para propôr.

2:53 da tarde <$BlogCommentDelete>
Blogger Alberto Oliveira said...

Sem pretender polemizar o assunto (até porque nem me parece haver pontos de vista diversos em relação aos "ícones") devo dizer -com o conhecimento de causa ´"ao vivo", que mau seria, após tantos anos a viver miseravelmente (cultural e economicamente), a vida neste país não tivesse levado uma volta para melhor. A escolaridade avançada e a possibilidade de fazer comparações com o exterior, são factores que pesam e que deveriam pesar mais ainda, numa maior exigência cívica. No entanto, e como comentas, a acção política não é aquela (e não apenas em relação ao "discurso") que se pretende para que se iniciem reformas sociais de fundo e se consolidem. Ao contrário, estão-se a criar cada vez maiores possibilidades económicas áqueles que já as detêem (o poder político central e as autarquias são uma fonte inesgotável de "recursos económicos") e cavando um fosso maior ainda entre os que pouco possuem (trabalhadores por conta de outrém).

4:37 da tarde <$BlogCommentDelete>
Blogger Alberto Oliveira said...

... desempregados, aposentados (não aqueles com reformas de luxo... ), enfim, um cortejo nada simpático e que não me orgulha absolutamente nada enquanto cidadão deste país...

5:02 da tarde <$BlogCommentDelete>
Blogger Gi said...

Eu ainda sou uma incorrigível romântica. Vive-se, recorda-se e vive-se outravez. Muita coisa passou à História mas eles fizeram parte da minha estória. Longínqua mas , pelo menos na altura, com muito significado. Aprecio aqueles que, mais do que por si, lutam por ideais. Mesmo que não sejam exactamente os meus . talvez por isso tenha conseguido ter apreço por alguns políticos que não perfilhavam a minha ideologia. Os bichos políticos como lhes chamava.Mas isso sou eu que também sou um bocado bicho :)

Um beijinho

12:04 da tarde <$BlogCommentDelete>
Blogger Manuel Veiga said...

valha-me Nossa Senhora de Fátima, que o "velho" Che está bem acima de tudo isto...

confesso que para a "robustez" dos teus argumentos me vai faltando "pedalada"...

... no entanto,

terás certamente a honestidade de reconhecer que vai uma certa distância entre os teus dois textos quanto à perenidade da política e dos ícones que a representam. pretender que Che ou Adriano não estão "vivos" porque em tua consciência (política) são "icones vazios" é de um dogmatismo intolerável! há mais vida nos caminhos para além dos teus "pós" ou da poeira "post moderna"!...

isto sem qualquer "menosprezo" pelo que escreves, pois que "desprezo" não faz qualquer sentido. de todo!...

cordialmente.

12:50 da tarde <$BlogCommentDelete>
Blogger O Profeta said...

As idéias mudam, os ideais nem por isso...


Beijinho

11:45 da manhã <$BlogCommentDelete>
Blogger manhã said...

legível:concordo contigo sobre os fossos gerados por esta economia de mercado. Cabe ao estado repôr uma certa equididade entre os cidadãos, ajudando aqueles que são mais fracos em todos os sentidos mas sem paternalismos, como justiça social, não dar a todos por igual mas dar consoante as condições específicas de cada um. Há certas instituições que não são passíveis de entrar no capitalismo em igualdade de circunstâncias, a educação é uma delas.

herético: Pretender que o estão (vivos) dá em igual pretensão dogmática.Mas continuando na via das razões,se os ícones representam ideais, resta saber se esses ideais são vivos, organismos palpitantes, será que o ideal revolucionário de Che em Cuba contribuiu para uma Cuba livre...basta analisar o que se passa no regime militar cubano.Quanto ao Adriano admiro algumas das suas canções, bonitas, mas o ideal por ele representado ou que o querem fazer representar teve sentido numa sociedade fascista, sem liberdade de expressão,etc hoje só como marco histórico, os discursos tecidos à roda destas homenagens são artificiais e passadistas. A realidade é dialéctica, urge novas interpretações.
cordialmente
manhã

profeta:Depende dos ideais,a verdade é que os ideais são feitos de ideias,ou devem ser, ideias que se vão testando, se não derem certo, pois mudemos de ideias.

6:57 da tarde <$BlogCommentDelete>

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