fériasNunca gostei do conceito. Mais nova e desalinhada contrariava a tendência comum e trabalhava nas férias, nesse mês onde a cidade de Lisboa ficava deserta e era possível vagabundear sozinha pelas ruas, as pessoas estavam mais descontraídas e as noites mais animadas, íamos para salas de cinema com ar condicionado enquanto lá fora se torrava. Nessas alturas ensaiava peças ou representava, trabalhava a substituir alguém numa livraria ou na copa de um restaurante. Era ponto assente que Agosto era para ficar na cidade porque os burgueses iam na massa mas nós não, os artistas eram o avesso, respiravam exactamente na altura em que todos sustinham a respiração.
Agora algo mudou, passados 20 anos muita gente tem apenas uma semanita de férias e ficar em Lisboa em Agosto não é nenhuma experiência revolucionária, há carros por todo o lado, um ar irrespirável e o mesmo frenesim de um dia normal de um normal período de trabalho. Aquele grande mês de êxodo foi substituído por uma semanita aqui outra além, concentrada e curta, a féria já nem se nota.
Como toda a gente, também tiro dez diazinhos para, utilizando uma expressão na moda, gozar num lugar qualquer, uma interrupçãozinha antes de começar tudo de novo, mas este novo espírito tecnocrata, de férias como terapia para poder trabalhar mais e melhor está a irritar-me. Muito.
O trabalho que se lixe (falo de trabalho assalariado que é o trabalho de quase todos nós) continuo a considerá-lo uma forma de escravatura torpe e mal cheirosa! Sacrificar o que somos ao trabalho parece-me coisa de carraça e não de homem e depois perdoem-me mas que se lixem as férias, a nossa vida não está compartimentada, é um todo gaita, um organismo palpitante, de onde saiem pequenas fagulhas de coisa nenhuma sem qualquer utilidade. Não vivemos para produzir, pelo contrário, na minha modesta opinião já produzimos porcaria que chegue e urge fazer uma pausa? Hein? Na produção, tirar o pé do pedal e bolinar? Ao sabor do vento.