terça-feira, janeiro 30, 2007

Preferências

Palavras:

Gosto da palavra serenidade
Porque me falta?
Também da palavra intenso
Porque me sobra?
Gosto da palavra que usas
sedimento
há corpos que caiem por terra e levantam poeira
fina poeira ao vento
sobre rochas e pedras
ficando, ajustando, prefazendo

Gosto de sementes, silêncios, segredos.
Se pudesse encontrava uma sombra escura
para meter algumas palavras
e não as libertava senão por metamorfose.
Por exemplo aprisionava o sarcasmo,
a humilhação e a indiferença
libertando-as mediante pagamento de multa
e promessa de não voltar.
O sarcasmo, ironia seria.
A humilhação verdade
e piedade para a indiferença

Não me acostumo com a palavra disciplina
soa-me a glicemia e compostos do sangue
Sangria
Pensamento e intelecto
São calmas e certas
mas brancas como barcos de vela num mar sem vento.
Ao desejo respondo e logo me arrependo
por mais voltas que dê
o desejo é palavra que deixa de ser
não se conforma
já desceu do dicionário e vagueia por aí
perseguida pelas autoridades
que a preferem morta.

domingo, janeiro 28, 2007

livros

Gosto de livros. Muito. Os livros são fiéis, não nos desiludem nem nos traem ao virar da esquina com um qualquer desconhecido, não mudam de mãos sem o nosso consentimento e não estão ocupados ou confusos quando mais precisamos deles. Não! mantêm-se à nossa espera como coisas austeras que são e surpreendem-nos com momentos de pura e genuína felicidade (ai essa palavra tão, não sei, tão não sei, tão borboleta em campo verde, tão berlinde de cristal!) retiro a felicidade, escolho prazer. Os livros dão-nos momentos deliciosos, de prazer, e não só... mas sejamos realistas, o mais importante não está nos livros, o que realmente mexe connosco não está nos livros, o que constitui a nossa memória mais sólida, aquela que faz sermos quem somos, não se constitui com imagens ou histórias lidas mas com histórias vividas, por isso, adoro livros mas não me arrumo com eles na estante, sei que eles estão lá e a vida está noutro sítio e é preciso não misturar porque misturas só se for em cocktail , e mesmo assim...têm que ter arte, and so on.
(fotografia de uma exposição que está no átrio da Gulbenkian, museu de arte moderna, muitos dos volumes são de filósofos...ao que nós chegámos...livra! )

quinta-feira, janeiro 25, 2007

tanta coisa nenhuma

Daquilo que falamos, hoje entre o Sol de um passeio à beira mar e o ar fosforescente de um Centro comercial, procurando um livro que parece estar definitivamente esgotado, entre um delicioso prato de sushi e uma ecológica camisola de um brama qualquer que faz yoga na Amazónia, na mão o telemóvel Nokia doente com a tampa completamente rachada e sem loja que venda tal acessório (terei de comprar novo telemóvel) penso, tanta coisa amontoada, tanta marca e produto e tanto exotismo vindo das Arábias para aterrar mesmo ali à frente do nosso nariz mas aquilo que verdadeiramente se quer não há, nadica de nada, é andar às voltas no carrossel com a bola pendurada à nossa frente a bater-nos na cara e sem conseguir dar a palmada, (não estou a falar de gamanço mas de infância e coisas de dar satisfação).

domingo, janeiro 21, 2007

manhã

Fotografia de Adriana Silva Graça

Hoje acordei em lençóis brancos
e senti os raios de sol a beijarem-me as mãos
e um braço a tombar sobre o meu peito
e percebi que amo corpos
que não amo almas.

quinta-feira, janeiro 18, 2007

bastardos e abortos

quer queiramos ou não bastardos e abortos são, a um nível imediato, duas palavras feias, palavras que causam repulsa.
Na aula, a propósito de Descartes e da forte convicção do pessoal adolescente que filósofos é corja de mal amados, sem tempo para namorar e sem grandes atractivos físicos (Descartes de facto!!!bem...) arrumei-lhes as ideias com a frase: " Consta que tinha alguns bastardos." Sururu ,risos, o "gaijo" heim, afinal tanto estudo e era um maluco! etc ...tanta doutrina e vais a ver queria era...um rol de cogitações deste calibre (mal eles sabem que este termo foi criado por causa dele! cogitações) Descartes passara rapidamente do austero filósofo ao "ganda maluco" do criador do sistema cartesiano ao prevaricador, bem...deixo...com o tempo vai assentando...
Há palavras assim que estão conotadas com coisas ruíns, monstruosidades, sinuosidades, prevaricações. Não é justo, não tem qualquer fundamento na razão ou nos valores, é um atentado ao nosso livre pensamento. Um bastardo é um filho ilegítimo, de quem o pai não quis saber, a história está cheia deles, o passado recente também...foi gerado às escondidas e nasce meio torto, segundo a moral vigente. Tal como o Bastardo o Aborto sofre do mesmo olhar enviesado. Aborto, mulher abortadora. Abortou. Aborta. A palavra lembra abertura larga de onde sai uma lava , espécie de vulcão, que expele embriões. Coisa do demónio o aborto é do domínio das trevas, escondido e envergonhada a mulher cujo segredo ninguém fala. As mulheres abortam, abstracto. Quem? Eu não!
Estas irracionalidades têm de acabar, são passado, desse passado pouco digno de orgulho. Interromper uma gravidez indesejada é um direito, fazê-lo em condições, é uma exigência de civilidade.Tenho uma forte impressão que se Descartes ouvisse isto sorria, tenho uma forte convicção de que estaria de acordo.

sábado, janeiro 13, 2007

Não sei quando cairá o crepúsculo, aquele que buscará entranhar-se na menina dos olhos para nos cegar parcialmente .Se uma metáfora pudesse servir-nos para agarrar e trazer à boca a vigilância permanente sobre esse sentimento obscuro, esse roçagar constante de um quase nada , esse suave odor de morte , então diria "pressentir que vai cair o crepúsculo é estar no meio dele, entre, dentro, a olhar" e que a palavra coitada fica a falar já no escuro. Recomeçemos: dizer " Não sei quando cairá o crepúsculo" é fazer poesia com a tristeza. E que queremos nós com a poesia senão que a espante ou a contorne deliciada erguendo-a até à condição de inspiração? Visão de um só a tristeza inicia-nos na divisão da palavra, na sua função demencial de prender e fugir, de a procurar para a deixar.

quinta-feira, janeiro 11, 2007

pedido

SE algum dos bloguistas ou não bloguistas que passar por aqui , tiver ou souber, de textos, fotografias, notícias de jornal ou outras informações sobre Luzia Maria Martins, (peças, espectáculos etc.) e não se importar de me ceder a informação, aqui fica um endereço :carcavelos.mar@gmail.com

terça-feira, janeiro 09, 2007

Orgulho e Preconceito

Jane Austen, Inglaterra, 1813

Li-o há dois meses. Durante uma semana vivi em paz e entusiasmo puros. Que posso dizer mais? Que é romântico, sim, absolutamente e totalmente romântico.

domingo, janeiro 07, 2007

A angústia da decisão

Oh poderosa arte da decisão! Como se aprende? Como se usa? Como se toma para nós ? Como se faz nossa e intransmissível? Como? Que aflição decidir algo. Vou? Não vou? Fico? Não fico? Faço? Não faço? Que raio de mecanismo simples ou sofisticado terá de ter alguém que sabe, gosta e decide? Que virtude? Que força anímica? Que espécie de dom?
À partida digo sempre sim. O Sim abre portas ,não é tão radical, deixa espaço para a reflexão, mas à medida que se vai aproximando o acontecimento assobio para o ar, dá-me uma fraqueza de pernas e braços, um amolecimento intelectivo, um pavor , um quebranto. Vêm as dúvidas...e depois se não gosto? e para quê? e será mesmo isto que eu quero? e não estou a perder tempo? e não é melhor fazer aquilo que gosto do que arriscar fazer algo que nem sei se sei? e o tempo passa e não decido nada, o tempo decide , penso, e o tempo lá vai decidindo em geral com muita dor e nem sempre a meu favor. Claro que se arranjam justificações...não tinha que ser...não é preciso golpes de rins, tudo tem de fluir...não estava na hora...convence-se os outros mas a nós próprios...só nos primeiros minutos.
Pensemos então no melhor: é melhor decidir ou deixar andar? Aqui não há dúvidas, bem ou mal há que fazer o caminho ,temos de escolher. Escolher é sinónimo de ser livre , as nossas decisões fazem-nos e bla bla bla todos os manuais de moral dizem o mesmo, o Aristóteles, o Espinosa (este é mais ambíguo) Kant, Mill, bla bla bla, o indivíduo, o seu valor, o carácter... mas penso...que interessa isto ao mundo? nadica...as coisas que não fiz alteram o mundo exterior tanto como as que fiz...talvez seja este relativismo moral, surdo e persistente que não me deixa decidir...maybe...maybe...

quinta-feira, janeiro 04, 2007


andava em andanças por aqui nos últimos dias do ano e o campo surpreendeu-me mais uma vez. Estão sempre a acontecer coisas novas mesmo para quem passa, vinda da cidade, e lhe pareça o mais pacato e parado sítio do mundo. Aqui um bando de corvos atirava-se às sementes ou a um qualquer parasita ou insecto que por aquelas bandas pousava. Desculpem-me a ignorância, se calhar não eram corvos! Oh minha cidade! quando compras tu, ou importas ou alugas, um bando de corvos ,campos semeados ,e esta paz?

(já agora -não resisto -sabem-me dizer onde estamos?)
atenção pois às sementes e às aves predadoras, é sempre precioso o dito espantalho!

terça-feira, janeiro 02, 2007

por aqui

mastigar umas passas e beber espumante, ver a Sónia Araújo ganhar o concurso "Dança comigo", discutir a reencarnação, tentar ouvir o fogo de artifício ao longe, pensar nos que amamos, sem esforço, assim porque nos aparecem, de repente, queremos levá-los para o ano seja como for, de pijama até!
pensar em campos verdes, desbravar caminho ...calcorrear, percorrer, parar, recomeçar, atirar palavras ao vento e confiar nesse senhor, Júpiter, eterno fanfarrão das musas e dos desconcertos.